Castelhanos hoje é uma praia tão famosa, e todos nós gostamos
tanto de lá, que decidi relatar como tudo começou, e faço isso com a ajuda preciosa
de Tia Carminha.
Meu avô sempre
foi um apaixonado pelo mar e, ao contrário de muitas pessoas e muitas famílias
que, naquela época, final da década de 60 e início da década de 70, não
conheciam o mar, a nossa o conheceu bem cedo. Desde quando eu me entendo por
gente, lembro-me de ir sempre a uma praia nas férias. E vovô era apaixonado
pelas praias do Espírito Santo. Alugava casas em Nova Almeida ,
Anchieta, Ubu, dentre outras cidades praianas, e aonde ele ia, a família sempre
o acompanhava.
Aquelas comédias
que a gente vê por aí, tipo “Mineiros em férias”, aconteceram conosco quando
fomos a Nova Almeida, isto porque resolveram juntar a nossa família com a de
Dona Palmira (mãe do Tio Willam), todos em uma só casa. Imagine a confusão. E,
lembrando-me dessas férias, não resisto aqui em contar um caso que aconteceu
nesse passeio. Não me lembro como, mas sei que em uma de nossas aventuras, para
conhecer o local, nos deparamos com um rio. O engraçado é que, mesmo eu sendo
muito pequena, recordo-me de alguns detalhes: o rio era muito certinho e
estávamos todos juntos. Ao nos depararmos com este rio, ficamos encantados,
pois devíamos estar meio que cansados do mar, então, na mesma hora, todos
pularam dentro dele. Lembro que fiquei com medo e não queria pular, quando me
jogaram e ainda comentaram:
- Menina fresca!
E o pessoal estava animado, uns
nadando, alguns mergulhando e outros saboreando aquela refrescante água:
- Nossa, que
delícia! Finalmente água doce!!! Prova, gente, é doce mesmo!!!!
E alguns gritavam:
- Nossa, acho que
passou um peixe por aqui. Olha a cobra, Ivana!!!
Bom, depois de um tempo vimos ao
longe umas três pessoas chegarem correndo e gritando. De longe não dava para
ouvir, mas, ao se aproximarem, entendemos tudo:
- Vocês são doidos
ou o quê??? O que pensam que estão fazendo? Este rio serve de esgootooo!! Saiam
daí rápido.
Não precisa nem dizer que do mesmo
jeito que entramos, saímos: sem palavras, todos cabisbaixos e envergonhados.
Não sei se foi tudo assim mesmo, mas a maior parte é verdade porque eu estava
lá.
Voltando às nossas incursões pelas
praias capixabas, em 1972 ou 1973, Tia Regina e Tio Carlos foram passar férias
em Anchieta, na casa de Wanda, irmã do Tio Carlos. Vovô então resolveu alugar uma
casa nas proximidades.
Em Anchieta
tínhamos que ir a outras praias, pois a de lá é praticamente inviável para se
tomar banho, então me lembro de que os adultos iam explorando algumas praias
(Praia do Balanço, Praia do Coqueiro, Monte H) e assim descobriram Castelhanos
que nesta época era uma praia virgem, sem nenhuma construção, nem loteamento.
Todos ficaram deslumbrados com a beleza desse local. E, surpresa das surpresas,
não é que começaram a passar trator em Castelhanos, abrindo assim as ruas de um
loteamento? A partir daí, Wilson e Alzira que eram recém casados abriram um
restaurante na orla e, ao lado desse restaurante, foi aberto um cômodo onde o
corretor, Sr. Lobo, começou a vender os
primeiros lotes.
Vovô se encheu de alegria e ficou
deslumbrado, pois aquela praia era o seu sonho, ela o encantou desde o início,
pois ao se chegar ao pé do morro de onde ela se descortina, a vista é
simplesmente deslumbrante. Era de longe a mais linda praia. E ele viu aí a oportunidade de realizar seu
sonho de ter uma casa na praia.
Quando acabaram
as férias e retornamos a Belo Horizonte, vovô resolveu convocar todos os filhos
para uma reunião. Contou a todos seu desejo e perguntou se queriam, juntamente
com ele, pagar as prestações do lote. E assim foi feito, e assim começou o
lindo sonho de ter uma casa na praia de Castelhanos.
Vovô escolheu o lote e, na época, não
sabia que seria na rua principal. O lote
também foi escolhido por ter uma linda e grande árvore bem no meio. Mal sabia
ele que aquela árvore teria que ser arrancada para a construção da casa.
Mesmo sem a ela, continuamos, todo ano, a alugar casas de
temporada em praias próximas. Ficávamos nessas residências e frequentávamos a
praia de Castelhanos, que tinha somente o restaurante. Quando acabamos de pagar
o lote, vovô reuniu novamente os filhos e fez a proposta de contratar um
empréstimo na Minas Caixa, onde Tio Carlos era o subgerente, para finalmente
construirmos a tão sonhada casa na praia.
E assim
começou a construção de nosso sonho. Isto foi no ano de 1974. O negócio foi
fechado com um aperto de mão do Tio Carlos com o construtor Sr. Antônio que, ao
dar o primeiro preço, não percebeu que era muito pouco para aquela obra; já Tio
Carlos, muito esperto, fechou o negócio na hora sem titubear. Nossa casa foi a
terceira construída. Era humilde, feinha até, mas muito aconchegante e fez a
nossa felicidade. Ela foi construída de frente para a rua principal e só depois
que vovô faleceu, mudamos a frente para a rua lateral, pois o movimento de
carros estava muito grande e como a rua era de terra a casa ficava cheia de poeira.
Ainda por cima, havia muitas crianças e todos tinham medo de acontecer algum
acidente. Para fazer essa mudança, foi preciosa a ajuda financeira da vovó e as
contribuições que os filhos davam todo mês.
Acho que o sucesso foi tão grande que a partir de nós, outras
pessoas conhecidas também compraram lotes lá (Dona Palmira, Ângelo Kalapotakis
etc).
Em uma de
nossas primeiras férias passadas lá, Tia Nezita e D. Palmira resolveram se
embrenhar mato adentro até chegarem a uma parte do mar ainda desconhecida por
todos. Ninguém sabia onde elas estavam e todos começaram a ficar muito preocupados
com o aquele sumiço. Somente muito tempo depois elas apareceram dizendo que estavam
num lugar maravilhoso, paradisíaco e que este lugar parecia com a boca de uma
baleia. Todos ficaram curiosos para ver este pedacinho do céu e, no dia
seguinte, toda a família Morais foi conhecer esse lindo lugar, que mais parece
uma lagoa e que, partir daí, ficou se chamando “Boca da Baleia”. Hoje em dia é
comum ver várias pessoas se dirigindo para lá ao entardecer somente para
apreciar o por do sol que é belíssimo. Pena que atualmente o local seja freqüentado
por muitos farofeiros que sujam a areia com restos de comidas, carnes de
churrascos etc.
Hoje me vêm à
lembrança tantas coisas que fica difícil até de escrever. São curiosidades que,
quem frequenta lá hoje, nem imagina que acontecia. O telefone é uma dessas
curiosidades. Existia um orelhão que ficava ao lado do restaurante e, à noite,
porque a “chamada a cobrar” era mais barata, formava-se uma fila imensa de
pessoas, todas ávidas por ligar para BH para dar notícias. Em tempos de dois
celulares por pessoa isto parece inacreditável, não?
Televisão também
nem pensar. O único lugar que tinha era no Tanharu, o primeiro hotel construído
e, às vezes, tomávamos coragem e íamos lá para assistir a um capítulo de uma
novela.
Outra coisa
legal é que quando chovia, as ruas se enchiam de barro e, no dia seguinte,
quando o sol aparecia, o barro ficava como uma crosta e era bem legal você ir
andando e pisando nestas placas e fazendo “croock, croock”.
Havia também
umas árvores com uns cipós imensos e a gente brincava muito de Tarzã. Era para
as crianças brincarem, mas teve gente mais velha que foi se aventurar de Jane e
se despencou no meio do caminho gritando: _ Uóóóóóóó.... Tarzãããããããã!!!! Né,
Tia Carminha???
Outra
curiosidade é que sempre íamos caminhando para a esquerda da praia e chegávamos
à Praia da Guanabara que tinha o mar muito bravo. Parece que lá teve um
loteamento bem antes de Castelhanos, mais chique até, mas que não deu certo. A
gente sempre via algumas construções de verdadeiras mansões abandonadas.
Inventávamos histórias macabras sobre aquelas casas.
Foi mais ou
menos assim que começou Castelhanos. Eu, particularmente, fico cheia de vaidade
quando algum conhecido fala que já foi e adora Castelhanos. Aí penso... “nós
que começamos aquilo ali.” E novamente me vem água aos olhos por pensar que não
aproveitei o bastante, e que meus filhos não viveram o que eu vivi por lá. A
“casa verde” que ficou com este nome por causa de sua pintura externa com os
pinheiros na frente, a mansão do Sr. Afrânio lá no alto, as castanheiras
pequenininhas, os guruçás que frequentavam as ruas à noite (o medo que eu tinha
de eles subirem por minhas pernas) e as primeiras barracas na praia são lembranças
bucólicas de uma infância e uma adolescência prazerosa.
Contribuição de Tia Carminha